Privatizações no setor elétrico brasileiro
O setor elétrico brasileiro vivia uma grave crise desde os anos 1980. As empresas haviam sido utilizadas para captar recursos para o tesouro no mercado internacional, endividando-se, e as tarifas haviam sido represadas para controlar a inflação e apoiar a indústria. Com a crescente influência do pensamento liberal sobre os governos, a proposta que se desenhava para essas empresas era a privatização com participação de investidores estrangeiros, incremento da competição e desregulamentação.
“A receita neoliberal para tratar a crise do Estado da década de 1980 foi a desestatização na década de 1990. No caso do setor elétrico, o remédio matou o doente”. Assim Luiz Pinguelli Rosa resumiu o processo de privatização iniciado no governo Fernando Henrique Cardoso. Embora, durante a campanha, Fernando Henrique tivesse adotado uma proposta moderada em relação a privatização deste setor, após a eleição de 1994 a sua equipe econômica acelerou o processo, com apoio do Congresso Nacional e de governadores como os de São Paulo e Rio de Janeiro.
A Escelsa – Espírito Santo Centrais Elétricas S.A. foi a primeira empresa do setor privatizada, em 11 de junho de 1995. A empresa foi vendida por R$ 357,92 milhões para um consórcio formado pelas empresas Iven S.A. e GTD Participações. A Iven era dirigida por José Luis Alqueres, que havia sido presidente da Eletrobras no governo de Itamar Franco. Sindicatos da categoria organizaram manifestações e uma pesquisa de opinião mostrou que a população do Espírito Santo era contrária à venda.
Pinguelli considerou o valor irrisório e declarou numa entrevista:
– É como vender uma casa, deixando de levar a mobília e esquecendo muito dinheiro nas gavetas.
A seguir, vieram Light (Rio de Janeiro), CERJ (também do Rio), Coelba (Bahia), AES Sul (Rio Grande do Sul), Enersul (Mato Grosso do Sul) e muitas outras. Em 1998, a Eletropaulo, uma das maiores distribuidoras, foi vendida. “Começou assim a desestruturação da própria Eletrobras. Pinguelli já observava ali que aquele caminho, se trilhado até o fim, iria levar à destruição da Eletrobras, fato que hoje estamos vendo acontecer”, disse em depoimento José Drummond Saraiva, engenheiro e companheiro de mobilização na época.
Durante este processo, Pinguelli se tornou uma das principais vozes de oposição às privatizações, que considerava danosas ao país. Participava de debates e marcava reuniões com todos os que poderiam evitar as vendas. Com José Drummond, Carlos Augusto Hoffman e Fernando Peregrino, elaborou estudos para o Ministério Público de Santa Catarina contra a privatização da Eletrosul. “A Coppe se tornou o centro de inteligência nacional contra esse processo global de submissão dos países ao mundo industrializado”, lembra Fernando Peregrino em seu relato sobre o amigo.
Apesar da mobilização, reforma do setor elétrico seguiu em frente, orientada por um relatório da consultora Coopers & Lybrand que desconsiderava as características do sistema brasileiro.
– Esqueceram que se tratava do Brasil, cujo sistema é hidrelétrico, e copiaram o sistema inglês para geração termoelétrica – comentou Pinguelli.
A proposta da consultoria, como elenca Pinguelli em sua autobiografia, era separar as áreas de geração, transmissão, distribuição e comercialização; introduzir a competição na geração e comercialização e criar a figura do produtor independente, entre outras medidas. O plano também previa a criação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema, além de um mercado atacadista de energia, que negociaria livremente a energia não contratada pelas distribuidoras.
Décadas mais tarde, Pinguelli continuava a se posicionar de forma contrária à privatização da Eletrobras, realizada em 14 de junho de 2022.
– Considero desastroso e contrário aos interesses nacionais. Certamente vai aumentar a tarifa e a política de investimento vai voltar ao Estado – disse ele em entrevista em 2021, com a autoridade de quem havia ocupado a presidência da Eletrobras.
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Enfim o governo federal irá queimar tudo para pagar dívidas, como o herdeiro viciado que vende a casa da família para saldar dívidas de jogo.”
Pinguelli
Privatizações no setor elétrico brasileiro
O setor elétrico brasileiro vivia uma grave crise desde os anos 1980. As empresas haviam sido utilizadas para captar recursos para o tesouro no mercado internacional, endividando-se, e as tarifas haviam sido represadas para controlar a inflação e apoiar a indústria. Com a crescente influência do pensamento liberal sobre os governos, a proposta que se desenhava para essas empresas era a privatização com participação de investidores estrangeiros, incremento da competição e desregulamentação.
“A receita neoliberal para tratar a crise do Estado da década de 1980 foi a desestatização na década de 1990. No caso do setor elétrico, o remédio matou o doente”. Assim Luiz Pinguelli Rosa resumiu o processo de privatização iniciado no governo Fernando Henrique Cardoso. Embora, durante a campanha, Fernando Henrique tivesse adotado uma proposta moderada em relação a privatização deste setor, após a eleição de 1994 a sua equipe econômica acelerou o processo, com apoio do Congresso Nacional e de governadores como os de São Paulo e Rio de Janeiro.
A Escelsa – Espírito Santo Centrais Elétricas S.A. foi a primeira empresa do setor privatizada, em 11 de junho de 1995. A empresa foi vendida por R$ 357,92 milhões para um consórcio formado pelas empresas Iven S.A. e GTD Participações. A Iven era dirigida por José Luis Alqueres, que havia sido presidente da Eletrobras no governo de Itamar Franco. Sindicatos da categoria organizaram manifestações e uma pesquisa de opinião mostrou que a população do Espírito Santo era contrária à venda.
Pinguelli considerou o valor irrisório e declarou numa entrevista:
– É como vender uma casa, deixando de levar a mobília e esquecendo muito dinheiro nas gavetas.
A seguir, vieram Light (Rio de Janeiro), CERJ (também do Rio), Coelba (Bahia), AES Sul (Rio Grande do Sul), Enersul (Mato Grosso do Sul) e muitas outras. Em 1998, a Eletropaulo, uma das maiores distribuidoras, foi vendida. “Começou assim a desestruturação da própria Eletrobras. Pinguelli já observava ali que aquele caminho, se trilhado até o fim, iria levar à destruição da Eletrobras, fato que hoje estamos vendo acontecer”, disse em depoimento José Drummond Saraiva, engenheiro e companheiro de mobilização na época.
Durante este processo, Pinguelli se tornou uma das principais vozes de oposição às privatizações, que considerava danosas ao país. Participava de debates e marcava reuniões com todos os que poderiam evitar as vendas. Com José Drummond, Carlos Augusto Hoffman e Fernando Peregrino, elaborou estudos para o Ministério Público de Santa Catarina contra a privatização da Eletrosul. “A Coppe se tornou o centro de inteligência nacional contra esse processo global de submissão dos países ao mundo industrializado”, lembra Fernando Peregrino em seu relato sobre o amigo.
Apesar da mobilização, reforma do setor elétrico seguiu em frente, orientada por um relatório da consultora Coopers & Lybrand que desconsiderava as características do sistema brasileiro.
– Esqueceram que se tratava do Brasil, cujo sistema é hidrelétrico, e copiaram o sistema inglês para geração termoelétrica – comentou Pinguelli.
A proposta da consultoria, como elenca Pinguelli em sua autobiografia, era separar as áreas de geração, transmissão, distribuição e comercialização; introduzir a competição na geração e comercialização e criar a figura do produtor independente, entre outras medidas. O plano também previa a criação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema, além de um mercado atacadista de energia, que negociaria livremente a energia não contratada pelas distribuidoras.
Décadas mais tarde, Pinguelli continuava a se posicionar de forma contrária à privatização da Eletrobras, realizada em 14 de junho de 2022.
– Considero desastroso e contrário aos interesses nacionais. Certamente vai aumentar a tarifa e a política de investimento vai voltar ao Estado – disse ele em entrevista em 2021, com a autoridade de quem havia ocupado a presidência da Eletrobras.
Enfim o governo federal irá queimar tudo para pagar dívidas, como o herdeiro viciado que vende a casa da família para saldar dívidas de jogo.”
Pinguelli
MATERIAL RELACIONADO
DOCUMENTO
- Parecer técnico sobre a cisão de Furnas (Programa de Planejamento Energético – Coppe/UFRJ e Ilumina, 12/4/1999)
- Privatização provocou retração dos investimentos (Revista do Legislativo – Assembleia Legislativa de Minas Gerais, 2001)
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ARTIGOS DE PINGUELLI
- Irregularidades e incompetência na privatização da Escelsa (Folha de São Paulo, 1/8/1995)
- Índia e Brasil: camisa de sardinha não dá em baleias (Folha de São Paulo, 24/2/1996)
- Light: privatização à moda Ioiô ou à viúva Porcina (Folha de São Paulo, 14/6/1996)
- Chomsky e os sócios silenciosos (Folha de São Paulo, 30/12/1996)
- A confissão (Tema em discussão: Privatização no setor elétrico, O Globo, 8/9/1997)
- O pacote e a globalização (O Globo, 9/12/1997)
- A privatização da privatização (Folha de São Paulo, 28/12/1998)
- Erros do Governo Lula (O Globo, 8/10/2004)
- Equívocos (Tema em debate: Privatização, O Globo, 27/10/2006)
- Clima, burocracia e políticas são causas da crise elétrica (Folha de São Paulo, 5/6/2014)
- Uma Eletrobrás eficiente é possível (Folha de São Paulo, 26/8/2017)
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MATÉRIAS E REPORTAGENS
- Fórum de Ciência quer suspender privatização (O Globo, 10/10/1992)
- Governo inicia privatização do setor elétrico pela Escelsa (Folha de São Paulo, 12/7/1995)
- Privatização agrava fornecimento de luz no Rio (Folha de São Paulo, 23/2/1997)
- Companhia de eletricidade da Bahia é vendida por R$ 1,73 bi (Folha de São Paulo, 1/8/1997)
- MS vende energética com ágio de 83,79% (Folha de São Paulo, 20/11/1997)
- Pinguelli Rosa contesta versão oficial sobre causa de blecaute (Folha de Londrina, 15/3/1999)
- Para físico, há risco de blecaute (Folha de São Paulo, 13/12/2000)
- Eletrobrás quer mais investimentos (O Globo, 7/1/2003)
- Programa tentará recuperar empresas elétricas (O Globo, 30/1/2003)
- Geradoras participarão de leilão de linhas (O Globo, 4/4/2003)
- Números chocam Pinguelli, que vai rever terceirização na Eletrobrás (O Globo, 3/8/2003)
- Entrevista: Luiz Pinguelli Rosa, presidente da Eletrobrás (O Globo, 19/9/2003)
- Depoimento de Pinguelli para o Programa de História Oral da Memória da Eletricidade (Centro da Memória da Eletricidade no Brasil, 24/10/2003
- Pinguelli critica a área econômica e defende investimentos em energia (O Globo, 13/11/2003)
- Eletrobrás pode dobrar investimentos (O Globo, 3/2/2004)
- Governo não deveria priorizar termelétricas, critica ex-presidente da Eletrobrás (Agência Brasil, 17/1/2006)
- Professor critica falta de investimentos no setor elétrico (Agência Brasil, 20/7/2006)
- Pinguelli: a Eletrobrás está sendo amputada pelo governo (Correio da Cidadania, 28/8/2007)
- Falta de planejamento e de investimento provocou atual crise de energia, diz Pinguelli (Agência Brasil, 9/1/2008)
- Pinguelli Rosa vê abertura para capitalização da estatal do setor elétrico (Agência Brasil, 14/3/2008)
- Crise pode exigir redirecionamento de investimentos no setor energético, diz Pinguelli (Agência Brasil, 12/11/2008)
- País não pode abrir mão de hidrelétricas, diz Pinguelli Rosa (Agência Brasil, 20/4/2010)
- Construção de hidrelétricas sempre gera impactos ambientais, afirma Pinguelli (Agência Brasil, 20/4/2010)
- Não faltou energia, faltou transmissão (O Globo, 5/2/2011)
- “O clima criado com a redução das tarifas de energia prejudica o sistema” (Carta Capital, 5/2/2014)
- Venda da Eletrobras passa longe do interesse nacional (Vermelho, 23/2/2018)
- Especialistas criticam privatização do setor elétrico e estratégia de resistência à agenda econômica (Planeta Coppe, 7/10/2019)
- Consequências da privatização da Eletrobras (Vermelho, 3/12/2019)
- “Com pouco dinheiro se abocanha o grupo todo”, diz Luiz Pinguelli sobre privatização da Eletrobras (Reconta Aí, 26/5/2021)
- Privatização da Eletrobras: conta de luz pode ficar até 25% mais cara (Vermelho, 23/6/2021)
- Vender a Eletrobras é parte da ilusão de que setor privado faz melhor (Vermelho, 2/6/2022)
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