A participação no Pugwash e a visita de Rotblat
Pinguelli Rosa participou por muitos anos do Pugwash Conferences on Science and World Affairs, movimento que reúne cientistas de todo mundo e defende o fim das armas nucleares. O Pugwash nasceu do manifesto escrito em 1955 pelo matemático e filósofo inglês Betrand Russell e pelo físico alemão Albert Einstein, defendendo que pesquisadores se unissem contra a ameaça nuclear, ultrapassando as fronteiras ideológicas que dividiram o mundo após a Segunda Guerra Mundial. Em 1957, um grupo de cientistas se reuniu na cidade de Pugwash, no Canadá, para um encontro que deu origem à organização. Desde então, as conferências têm se realizado regularmente e, mesmo durante a Guerra Fria, continuaram a agregar pesquisadores de todos os continentes.
As conferências Pugwash ajudaram a mediar negociações para os principais tratados mundiais para desarmamento: o tratado para o fim das provas nucleares firmado em 1963, o Tratado de Não-Proliferação nuclear, de 1968, e a Convenção sobre Armas Biológicas, de 1972. Relator do estudo que demonstrou que o governo brasileiro tinha a intenção testar armas nucleares, em 1986, e crítico à proliferação de armas nucleares, Pinguelli foi membro do Conselho do Pugwash de 1999 a 2001 e sempre acompanhou os debates do grupo.
Na sua autobiografia, Pinguelli conta que em 1995, durante um encontro que marcou os 50 anos das explosões nucleares em Hiroshima e Nagasaki, assistiu no Japão a um debate entre o físico Joseph Rotblat, signatário do manifesto de Russell e Einstein e presidente do Pugwash, e um representante americano.
“Este, defendendo a posição oficial do seu país, afirmara que o emprego da bomba tinha sido necessário, do ponto de vista da estratégia militar, para pôr fim à guerra com o Japão. Rotblat pediu a palavra e laconicamente comentou:
– Os Estados Unidos julgam-se mais poderosos do que Deus, pois este pode fazer a história futura, mas vocês mudam a história passada.”
Pinguelli aproveitou a ocasião para convidar Rotblat a fazer uma conferência na Coppe. Aos 86 anos, o físico veio ao Brasil em 1995 e fez uma palestra que atraiu grande público e atenção da imprensa. Afinal, além de ser um dos 11 cientistas que assinaram o manifesto de Russel e Einstein, Rotblat tinha sido o único integrante do projeto Manhattan, de construção das primeiras bombas atômicas nos EUA, por não concordar com o plano de uso das armas, em 1944.
A história foi contada por Pinguelli em artigo: “Quando em 1944 ficara claro que os alemães haviam abandonado seu projeto de bomba, o físico Joseph Rotblat entendeu (…) que deixara de haver razão para ele permanecer em Los Alamos e pediu permissão para sair (os cientistas estavam sob compromisso e sob forte esquema de segurança). Por que outros cientistas não tomaram a mesma decisão? Segundo Rotblat, o motivo mais frequente era o simples interesse científico. Esse interesse os levava a esperar até o teste da primeira bomba (de plutônio), em Alamogordo, no Novo México. Outros achavam que o lançamento da bomba no Japão em Hiroshima (de urânio enriquecido) e Nagasaki (de plutônio, como a de Alamogordo) evitaria a perda das vidas de muitos soldados norte-americanos. Outros ainda, mesmo discordando, preferiram calar-se para não prejudicar sua carreira futura como cientistas nos EUA.”
Na sua visita ao Brasil, Rotblat disse à Folha de S. Paulo: “Alguns cientistas, na América e na União Soviética, traíram os ideais da ciência. Cientistas devem trabalhar para o benefício da humanidade, não para sua destruição. Como a ciência não é neutra, cabe aos cientistas verificar que ela seja aplicada adequadamente”.
Poucos dias após a palestra, Rotblat ganhou o Prêmio Nobel da Paz.
Em 1998, Pinguelli organizou um encontro do Pugwash no Rio de Janeiro e Rotblat voltou ao Brasil. Presidente na época, Fernando Henrique Cardoso o recebeu em uma audiência no Palácio do Planalto, acompanhado por Pinguelli. O físico pediu a Fernando Henrique que o Brasil assinasse o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares.
A adesão ao Tratado era polêmica, pois o acordo mantinha os arsenais nucleares dos países que já detinham os armamentos e restringia o acesso a tecnologia nuclear para fins pacíficos. Apesar das restrições, o tratado foi assinado meses depois.
A posição militante pela paz passou a caracterizar a ação política de muitos físicos em todo o mundo. No Brasil, a Sociedade Brasileira de Física e a SBPC se opuseram ao teste nuclear que se pensou fazer na base de Cachimbo, no Pará, em um programa herdado dos governos militares. Essa é uma atitude ética e política. “
Pinguelli
A participação no Pugwash e a visita de Rotblat
Pinguelli Rosa participou por muitos anos do Pugwash Conferences on Science and World Affairs, movimento que reúne cientistas de todo mundo e defende o fim das armas nucleares. O Pugwash nasceu do manifesto escrito em 1955 pelo matemático e filósofo inglês Betrand Russell e pelo físico alemão Albert Einstein, defendendo que pesquisadores se unissem contra a ameaça nuclear, ultrapassando as fronteiras ideológicas que dividiram o mundo após a Segunda Guerra Mundial. Em 1957, um grupo de cientistas se reuniu na cidade de Pugwash, no Canadá, para um encontro que deu origem à organização. Desde então, as conferências têm se realizado regularmente e, mesmo durante a Guerra Fria, continuaram a agregar pesquisadores de todos os continentes.
As conferências Pugwash ajudaram a mediar negociações para os principais tratados mundiais para desarmamento: o tratado para o fim das provas nucleares firmado em 1963, o Tratado de Não-Proliferação nuclear, de 1968, e a Convenção sobre Armas Biológicas, de 1972. Relator do estudo que demonstrou que o governo brasileiro tinha a intenção testar armas nucleares, em 1986, e crítico à proliferação de armas nucleares, Pinguelli foi membro do Conselho do Pugwash de 1999 a 2001 e sempre acompanhou os debates do grupo.
Na sua autobiografia, Pinguelli conta que em 1995, durante um encontro que marcou os 50 anos das explosões nucleares em Hiroshima e Nagasaki, assistiu no Japão a um debate entre o físico Joseph Rotblat, signatário do manifesto de Russell e Einstein e presidente do Pugwash, e um representante americano.
“Este, defendendo a posição oficial do seu país, afirmara que o emprego da bomba tinha sido necessário, do ponto de vista da estratégia militar, para pôr fim à guerra com o Japão. Rotblat pediu a palavra e laconicamente comentou:
– Os Estados Unidos julgam-se mais poderosos do que Deus, pois este pode fazer a história futura, mas vocês mudam a história passada.”
Pinguelli aproveitou a ocasião para convidar Rotblat a fazer uma conferência na Coppe. Aos 86 anos, o físico veio ao Brasil em 1995 e fez uma palestra que atraiu grande público e atenção da imprensa. Afinal, além de ser um dos 11 cientistas que assinaram o manifesto de Russel e Einstein, Rotblat tinha sido o único integrante do projeto Manhattan, de construção das primeiras bombas atômicas nos EUA, por não concordar com o plano de uso das armas, em 1944.
A história foi contada por Pinguelli em artigo: “Quando em 1944 ficara claro que os alemães haviam abandonado seu projeto de bomba, o físico Joseph Rotblat entendeu (…) que deixara de haver razão para ele permanecer em Los Alamos e pediu permissão para sair (os cientistas estavam sob compromisso e sob forte esquema de segurança). Por que outros cientistas não tomaram a mesma decisão? Segundo Rotblat, o motivo mais frequente era o simples interesse científico. Esse interesse os levava a esperar até o teste da primeira bomba (de plutônio), em Alamogordo, no Novo México. Outros achavam que o lançamento da bomba no Japão em Hiroshima (de urânio enriquecido) e Nagasaki (de plutônio, como a de Alamogordo) evitaria a perda das vidas de muitos soldados norte-americanos. Outros ainda, mesmo discordando, preferiram calar-se para não prejudicar sua carreira futura como cientistas nos EUA.”
Na sua visita ao Brasil, Rotblat disse à Folha de S. Paulo: “Alguns cientistas, na América e na União Soviética, traíram os ideais da ciência. Cientistas devem trabalhar para o benefício da humanidade, não para sua destruição. Como a ciência não é neutra, cabe aos cientistas verificar que ela seja aplicada adequadamente”.
Poucos dias após a palestra, Rotblat ganhou o Prêmio Nobel da Paz.
Em 1998, Pinguelli organizou um encontro do Pugwash no Rio de Janeiro e Rotblat voltou ao Brasil. Presidente na época, Fernando Henrique Cardoso o recebeu em uma audiência no Palácio do Planalto, acompanhado por Pinguelli. O físico pediu a Fernando Henrique que o Brasil assinasse o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares.
A adesão ao Tratado era polêmica, pois o acordo mantinha os arsenais nucleares dos países que já detinham os armamentos e restringia o acesso a tecnologia nuclear para fins pacíficos. Apesar das restrições, o tratado foi assinado meses depois.
A posição militante pela paz passou a caracterizar a ação política de muitos físicos em todo o mundo. No Brasil, a Sociedade Brasileira de Física e a SBPC se opuseram ao teste nuclear que se pensou fazer na base de Cachimbo, no Pará, em um programa herdado dos governos militares. Essa é uma atitude ética e política. “
Pinguelli
MATERIAL RELACIONADO
DOCUMENTOS
- Statement: The Russell-Einstein Manifesto (Pugwash, 9 jul 1995)
- Rio de Janeiro consultation on Brazilian-Argentinian cooperation (Pugwash, 9 out 2001)
- Bariloche meeting on Economic and Social Inequities in Latin America (Pugwash, 12 set 2004)
- História do Pugwash (Pugwash Brasil, 20 fev 2019)
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ARTIGOS
- Hiroshima, Nagasaki, Angra, um percurso (Pinguelli, O Globo, 12 set 1999)
- Do terror ao risco de guerra nuclear (Pinguelli, Folha de São Paulo, 5 out 2001)
- Problemas de um tratado (Pinguelli e Fernando Souza Barros, O Globo, 21 dez 2002)
- O manifesto Russell-Einstein e as conferências Pugwash (Fernando Souza Barros, Sociedade Brasileira de Física, 2005)
- A física entre a guerra e a paz – reflexões sobre a responsabilidade social da ciência (Pinguelli, Ciência e Cultura/SBPC, jul-ser 2005)
- A sombra de Hiroshima sobre nós: 60 anos depois (Pinguelli, Planeta Coppe, 2 ago 2006)
- A batalha atômica (Pinguelli, Planeta Coppe, 4 ago 2006)
- 75 years after (Paolo Cotta Ramusino, Pugwash, 5 ago 2020)
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MATÉRIAS E REPORTAGENS
- Físico da bomba atômica pede ética na ciência (Jornal do Brasil, 3 out 1995)
- Cacos da bomba atômica (Folha de São Paulo, 8 out 1995)
- Rotblat ajudou a fazer bomba (Folha de São Paulo, 14 out 1995)
- Um Nobel contra Chirac (O Globo, 14 out 1995)
- Físicos nucleares pressionam por desarme (O Globo, 21 jul 1996)
- Um diálogo entre Sir Joseph Rotblat e o presidente da SGI, Daisaku Ikeda (Cultura de Paz, fev 2000)
- The Early Days of Pugwash (Physics Today, jun 2001)
- Lembre-se de sua humanidade: Aniversários do Manifesto Russell-Einstein, caso ICJ e bombardeio do Rainbow Warrior (Global Campaign for Peace Education, 8 jul 2020)
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VÍDEOS