Pinguelli

por José Pedro Rodrigues de Oliveira, ex-presidente de Furnas

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Os primeiros momentos da gestão de Pingueli na Eletrobras coincidiram com a fase em que se levantou a situação de FURNAS, preparada no final do Governo FHC para ser privatizada.

A frágil situação de FURNAS foi retratada a Pingueli, aos Diretores da Eletrobras e de Subsidiárias, na primeira reunião conjunta do Sistema, que revelou seu espírito de atuação, durante toda sua gestão.

Impossibilitada de contratar empregados, tendo recorrido à contratação de mais de 2000 terceirizados para continuar prestando seus serviços estatutários, sem executivos de mais experiência – atraídos por proposta de aposentadoria com ganhos expressivos – descontratada,  por conseguinte, com elevados “déficit” de caixa, e com problemas em sua Fundação de Seguridade, Furnas passava pelo momento mais grave de sua história.

E isso é o que a Empresa exporia, na primeira reunião do Sistema Eletrobrás, logo após a posse de Pingueli.

Essa reunião mostraria o retrato do Setor Elétrico, a  situação de cada uma de suas empresas, a disposição técnica dos Departamentos da holding e as prioridades e forma de gestão  de seu novo Presidente, a todos participantes – Eletrobrás, Furnas, Chesf, Eletronorte, Eletrosul. 

Interessante é a lembrança de que seu início teve de ser adiado. Diretores da Eletrobrás, primeiros a se manifestar segundo a agenda, alegaram que a base de áudio visuais para seus pronunciamentos  não ficara pronta.

E Pingueli, com um “como é que pode” e um estremecer de sua mesa, cortou a agenda e se culpou por ter convocado a reunião para aquele horário. Isso marcou sua forma incisiva, direta e simples de atuação, sem as “pompas da corte”.

Ele afirmou ser sua a responsabilidade pelo atraso, e a intenção de fazer da Eletrobrás um instrumento de apoio direto à ação das Subsidiárias, em todo sentido, seja no técnico seja na de relações com os Estados e com Brasília. E que as reuniões seriam regulares para “todos conhecerem os problemas e ações de todos”. E que. a partir daí tudo deveria se somar, num esforço conjunto e conhecido de todos, para que o Sistema  Eletrobrás fosse sentido ao estar dando ao País a base energética necessária ao seu desenvolvimento.

Mas, assim como agiu na primeira reunião, deu outros exemplos de comportamento singular, como tendo, na antessala do MME, se negado a cumprimentar um Governador de Estado, que reiteradamente estava sendo cobrado por Furnas, pelo não pagamento de sua estatal ao fornecimento de energia. Tendo aquele queixado à Ministra, na reunião que se seguiu, Pingueli  simplesmente disse, “eu o cumprimento em seu Estado, quando sua dívida for paga”. E isso aconteceu…

Se a história mostra que Furnas promoveu seus Chefes de Divisão e Departamento, reestruturando-se, que manteve os contratados (apesar de intensos trabalhos técnico-políticos que visaram a afasta-los), que reergueu sua Fundação de Seguridade, que venceu leilões de energia, que apresentou os melhores resultados financeiros de todas épocas, isso se deve à força e à competência de seu pessoal, mas, também, ao incontestável apoio inicial de Pingueli à sua atuação.

Ele foi o primeiro a ter em mãos o retrato de uma situação de choque com que foi Furnas recebida. Sempre se colocou ao lado da Empresa, ferida e ameaçada no passado com armas inusitadas voltadas à privatização.

Ao deixar a Eletrobrás, Pingueli foi homenageado por empresas e instituições, tendo Furnas, recuperada, prestando bons serviços ao Sistema e lucrativa, comparecido e se pronunciado. 

A única tristeza que Pingueli teria tido com o Setor Elétrico os céus se encarregaram de lhe ocultar. Foi-se antes da privatização “impossível” da Eletrobrás, cujo sistema é mormente hídrico, e as águas de nossos rios, sendo de todos, não podem ser privatizadas. Um presente à altura de sua atuação é disso ter ficado livre.